(foto de GMV)
Transcrever o real não é tarefa fácil. Principalmente, quando o meu real se transfigurou de Natural e emana diversidades. Não é fácil reproduzir os sentires de um dia que amanhece verde e anoitece paleta de cores.
Tenta-se compor a tela. Na sinestesia antecipada, os olhos tocam, calmamente, a ave negra que rasga os céus matinais. O ar sabe a flores que, acariciadas pelo Sol, vão acordando... devagar. Hortênsias também, muitas hortênsias, mas sem a vaidade dessa personagem dramática de Leandro, Rei da Helíria. Aliás, os meus lindinhos, ao fim de uma aula, já tinham interiorizado que flores só mesmo Violetas.
Por aqui, não há violetas. A terra exibe gladíolos vermelhos, canas da Índia vermelhas, rosas bravas e, desculpem, vermelhas. Nunca parei muito para pensar nas razões que pintaram o meu jardim de três tons... o verde, o vermelho e essa cor que têm as hortênsias. No entanto, agrada-me, o vermelho, claro!
O céu impõe os sabores da chuva, que não cai. Fica retida, nas formas disformes que desenham o azul. De quando em vez, as nuvens, umas brancas, outras cinzentas escuras, afastam-se ligeiramente, deixando que o calor da estrela-mãe se possa espargir sobre os campos ornados de videiras...
A tela parece monótona... É o campo, bem sei. Tão difícil de descrever!
Sempre que o meu palco se transforma em Natural, as palavras ficam presas, custam a brotar, ressentem-se de tanta cidade, apavoram-se com o brilho das cores, com os sons dos seres vivos, que fazem questão de gritar que estão vivos... os sons que calam as palavras. No silêncio da noite, a encenadora descansa... sem peça, sem personagens, sem fingir... sem palavras.
Transcrever este real não é tarefa fácil, porque o meu sentir... os meus sentires quase me levam a acreditar que podia ser um sonho.
Bons sonhos!
5 comentários:
Primeira visita!
Há... como sou feliz em meus sonhos.
beijooo.
Boas férias nesse Minho lindo. Fico contente por saber que levaste o computador de férias contigo...assim poderemos conversar. Mil bjocas.
Tu sem palavras? dá vontade de rir.
bjos
PJB
Descanso no tempo que desespera que passe, aguardo pela intimidade de um estar que nunca poderá ser, deitado no primeiro dos últimos recantos, em cima de um granito atiçado pelo sol, à sombra de um pinheiro rebaixado pelo vento, ouço o silencio das ovelhas que resvalam o declive. Ladra o cão, apregoa o pastor. Num quase ramerrão que se quer infinito, com o mesmo burburinho o burro, irrompe, pela ponte, sem descanso. O rio que vai quase desprovido, desabitado das suas trutas, tem a certeza de chegar a ser Mondego. As Oliveiras preparam-se para a próxima apanha. O olhar para o céu, descobre o sol entre duas nuvens, o vento continua passando, como para ocupar mais um espaço sonoro, uma intensa frescura vem da água. Continuo induzido numa sensação de estar, de ser, de intenso amalgama que nada pode corresponder. Uma madalena de Proust.
Sereno beijo de descanso.
... e ousa. Ousa recolorir. E o verde terá outros verdes. E os vermelhos também. O sonho permite tudo.
Bjos
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