[Luís]
Todos os dias, quando o 'pano' cai, no final de mais uma representação, há um momento solene, de silêncio breve. As palavras embatem no fechar da boca, rebelam-se, querem-se libertas num rasgo de pensamento. No entanto, a oclusão labial é mais forte. amuralha a vontade.
Este é um ensaio sobre nada, sobre aquele tempo que não existe, sobre um palco de peças vazio, sobre uma personagem que se diluiu numa máscara de cansaço. Este é um ensaio sobre palavras por haver, palavras gastas, despidas de semânticas falsas.
Este é um ensaio que não chegou sequer a tentativa. Perdeu-se nas inutilidades da repetição. Dos dias. De todos os dias em que o 'pano' cai e as palavras se agrilhoam.
Todos os dias, a encenadora resiste e insiste. Baralha as personagens, numa representação que ninguém entende... porque nem a encenadora entende!
Este é um ensaio sobre coisa nenhuma, sobre palavras desassossegadas, que só encontram paz na voz do Poeta. Seja.
"Tenho neste momento tantos pensamentos fundamentais, tantas coisas verdadeiramente metafísicas que dizer, que me canso de repente, e decido não escrever mais, não pensar mais, mas deixar que a febre de dizer me dê sono, e eu faça festas com os olhos fechados como a um gato, a tudo quanto poderia ser dito." (Bernardo Soares)