Se sou alegre ou sou triste?...
Francamente, não o sei.
A tristeza em que consiste?
Da alegria o que farei?
Não sou alegre nem triste.
Verdade, não sei que sou.
Sou qualquer alma que existe
E sinto o que Deus fadou.
Afinal, alegre ou triste?
Pensar nunca tem bom fim...
Minha tristeza consiste
Em não saber bem de mim...
Mas a alegria é assim...
O poema é do Mestre. Desse ser magnífico nascido no dia 13 de Junho. Hoje é dia de Santo António. Lisboa marcha com cheiro de sardinha assada. Para todos, é dia do santo que abençoa casamentos. Para alguns, é feriado. Para mim, é o dia de Fernando Pessoa.
Faz hoje 120 anos que nasceu essa figura universal. Português. Lisboeta. Esquecido, enfim. Provavelmente, hoje será recordado em alguns pontos do nosso frágil Mundo. Será lembrado pelas suas palavras, libertando beleza a cada sílaba. Será, talvez, homenageado com documentários televisivos em línguas vivas, mas estrangeiras.
No seu país? No meu país? Falar-se-á talvez do treino à porta fechada, na abertura dos telejornais. Falar-se-á do provável seleccionador, agora que o brasileiro decidiu com o coração recheado de libras. Falar-se-á de camionistas, de combustível, dos resultados do referendo da Irlanda, da ressaca da sangria bebida em copos sujos pelos bairros de Lisboa.
Não sei se alguém irá avivar a memória com um poema de Pessoa.
A minha está repleta deles. Dos poemas que ficam bem em qualquer momento da minha simples vida. No palco da existência, já fui acompanhada por Pessoa nas mais variadas representações quotidianas. Fosse numa estrada deserta, na escuridão de uma noite, entre Vilar e Chaves; fosse no mar azul alentejano, entre uma onda e outra; fosse no silêncio do monte da Cividade, em pleno Alto Minho; fosse tão somente numa aula, porque, claro, sou Professora.
O poema, com que hoje componho o cenário do meu palco, é a prova da simplicidade da ideia, feita verdade pela poesia.
Hoje é dia de Santo António. Dia de manjericos. Dia de quadras populares. E quantas, sem que a multidão barulhenta o saiba, foram criadas pela imaginação daquele que nasceu neste dia, no longínquo ano de 1888?
Fica uma. Não como tributo ao Santo. Mas com todo o respeito ao Poeta.
Tenho vontade de ver-te
Mas não sei como acertar.
Passeias onde não ando,
Andas sem eu te encontrar.